Abordagens e sentidos: a pintura como possibilidade poética
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As pinturas que fazem parte desta mostra servem como pretexto para trazer à tona discussões sobre essa linguagem que teve como vocação, dentro da história da arte, estar sempre à beira do abismo, basta lembrar seu fim anunciado por tantas vezes. Em vez de acabar, a pintura passou por significativas transformações mantendo-se no topo da pirâmide como uma das opções de artistas em diferentes períodos. Em uma brevíssima retomada da pintura na história da arte, vamos relembrar alguns fatos fundamentais que se consolidaram como marcos importantes na história da pintura. Na modernidade, o surgimento das pinturas monocromáticas e do ready-made foram cruciais para o desenvolvimento da sua história. As pinturas de Kasimir Malevich (1878-1935), como o Quadrado negro sobre fundo branco (1913-1915), que o colocou como ícone da arte moderna, além das séries de pinturas Branco sobre Branco (1917-18), são referências emblemáticas. Alexander Rodchenko (1891-1956) realizou pinturas monocromáticas: Puro Vermelho, Puro Azul e Puro Amarelo (1921), em que levou às últimas consequências o caráter pictórico. Já em 1963, década importante da história e marco do início da arte contemporânea, o artista Ad Reinhardt (1913-1967) criou uma série de pinturas abstratas evidenciando a importância da luz na pintura. Apenas para citar mais alguns nomes que realizaram obras que mudaram essa história temos em Jackson Pollock (1912-1956), criador da action painting, o sinônimo de liberdade e expressividade. Os brasileiros Lygia Clark (1920-1988) e Hélio Oiticica (1937-1980) revolucionaram a pintura, pois, graças a eles, as pinturas saíram da parede para se transformarem em cor e movimento no espaço. Vale a pena citar também os anos de 1980 e a volta da pintura, já que nessa época, depois de um período de arte conceitual, a emblemática exposição Como Vai Você Geração 80?, ocorrida no Rio de Janeiro, em 1984, foi, sem dúvida, uma retomada da pintura que impôs novas questões, trazendo uma liberdade e uma aproximação com o cotidiano em grandes dimensões, em que a cor e o gesto sobrepujaram temas. E hoje, pintar seria uma utopia? Para os artistas desta mostra, a pintura indica que em primeiro lugar vem a sensibilidade e depois a razão. Contudo, o debate que trazem acerca da pintura no cenário contemporâneo aponta que é a partir da tradição que ocorre a sensibilidade. Pensar na pintura hoje é deter-se em diferentes aspectos, como apropriações, simulacros ou mesmo objetos coloridos que se deslocam no espaço e se referem à percepção e à memória, mas acima de tudo ao prazer de deixar fluir os sentidos na busca de expressão. As experiências particulares de cada um refletem nos processos que evocam fatos, coisas e figuras, em metáforas ou em belíssimas estruturas abstratas de refinado apelo visual. Os elementos estéticos usados por cada artista filtram-se a partir de suas histórias e de suas buscas particulares em relação à técnica e avançam por diferentes caminhos experienciando suportes e materiais à procura de uma pintura capaz de suscitar novos debates sobre sua história na atualidade, apesar da pluralidade de estilos, dos diferentes conceitos e repertórios. Ana Zavadil |