Adolfo Montejo Navas in illo tempore outubro de 2012 |
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In illo tempore (Naquele tempo, Há tanto tempo) faz parte de uma série de poemas visuais mergulhados no âmbito de locuções latinas de uso mais ou menos frequente, e cuja sobrevivência na escrita culta ainda oferece um imaginário trans-temporal, mais sincrônico que diacrônico, uma situação léxica de alguma forma paradoxal. Desse conjunto até agora inédito (que se pode ver dentro da galeria como caderno ou doméstica edição), escolhi esse exemplo para a Vitrine Efêmera transmutado em instalação, por achar que a travessia do papel para o espaço aumentava o seu conceito sensorial, a sua vertigem.
A ideia poética originária de que a expressão ficasse pequena, quase diminuta, perdida no horizonte do papel – sempre como tradução e desvio de sua semântica–, ganha na vitrine certo abismo perceptivo; se amplifica pelo espaço real, o contexto público, e o próprio convite visual fornecido pela presença de uns binóculos colados no vidro. O trabalho joga assim com o exterior da rua, com o pedido de atenção para olhar e adivinhar esse tempo que só se pode ver com um instrumento ótico de enxergar coisas ao longe, e que serve para nos aproximar.
Além da surpresa e do enigma implícitos, há uma ironia visual querendo fazer também deste In illo tempore (2002/2012) uma experiência que mexe com as coordenadas espaço-temporais de maneira concentrada, com o jogo da proximidade e da distância. Ele nos coloca em certa assombração, ou melhor, naquela vertigem produzida pelo tempo e pela sua vibração.
Adolfo Montejo Navas
Rio/Foz, outubro de 2012
A ideia poética originária de que a expressão ficasse pequena, quase diminuta, perdida no horizonte do papel – sempre como tradução e desvio de sua semântica–, ganha na vitrine certo abismo perceptivo; se amplifica pelo espaço real, o contexto público, e o próprio convite visual fornecido pela presença de uns binóculos colados no vidro. O trabalho joga assim com o exterior da rua, com o pedido de atenção para olhar e adivinhar esse tempo que só se pode ver com um instrumento ótico de enxergar coisas ao longe, e que serve para nos aproximar.
Além da surpresa e do enigma implícitos, há uma ironia visual querendo fazer também deste In illo tempore (2002/2012) uma experiência que mexe com as coordenadas espaço-temporais de maneira concentrada, com o jogo da proximidade e da distância. Ele nos coloca em certa assombração, ou melhor, naquela vertigem produzida pelo tempo e pela sua vibração.
Adolfo Montejo Navas
Rio/Foz, outubro de 2012
Naquele tempo agora – na Vitrine Efêmera – que passou
Quando olhamos através de um binóculo, buscamos a aproximação de uma paisagem, situação ou objeto que se encontra a grande distância. Vemos, então, de forma ampliada, aquilo que antes não conseguíamos distinguir. A súbita revelação da imagem pode nos surpreender, quando nem desconfiamos do que está lá, longe... em sua existência minúscula.
Não há dúvida quanto ao aspecto lúdico, irônico até, que envolve o uso do binóculo. Voyeurismo sem maiores consequências ou espionagem intencional, o binóculo aqui é passaporte para uma viagem no tempo, qualquer tempo que se escolha, mas sempre outro...
Adolfo Montejo trabalha com uma série de expressões latinas realocando significados de um vernáculo não mais em uso, porém subjacente a todo idioma de origem latina e residual na linguagem contemporânea. Mesmo que não saibamos a tradução de uma palavra em latim, intuímos o que ela significa. Há uma memória ancestral, arquetípica, inscrita, talvez, em nosso DNA.
O jogo que Adolfo sugere é irônico, uma espécie de charada visual-linguística espacio-temporal: através do binóculo, em letras quase imperceptíveis na parede do fundo da Vitrine, o que lemos nos desconcerta, porque nos envia a um lugar temporal, num movimento de retorno a onde estamos... In illo tempore.
A expressão latina in é uma preposição que pode ser usada como verbo, designando movimento, deslocamento no espaço em direção a um ponto – lugar ou tempo. Funciona como “em”, “contra”, “para”, “sobre”, “entre”, “durante”, “depois”, “até”, “diante de”...
A palavra illo, adverbio, designa lugar, porém incorporando também o movimento de ir, encaminhar-se para um ponto além, que pode significar ponto de partida ou somente um ponto situado do lado de lá.
Tempore, diferentemente de tempus (tempo, momento, instante, hora), precedido de in designa especificamente “em tempo oportuno”, novamente nos remetendo à ideia de tempo-lugar - no caso da instalação na Vitrine, aqui agora.
O binóculo, ao revelar a expressão In illo tempore, funciona como dispositivo de deslocamento no tempo e evoca uma memória; como dispositivo de deslocamento espacial enfatiza a idéia de distância e nos remete a uma época vinculada àquela memória, portanto ausente, mas tornada presente e atual pelas palavras aproximadas.
Giorgio Agamben diz que contemporâneo é aquele que percebe, de seu tempo, não as luzes e sim as sombras. Deduz-se que, para obter uma percepção menos distorcida do presente em que estamos imersos, é necessário distanciamento. E que distanciamento seria esse? A Crítica? A História? O Tempo?
Talvez seja isso que o artista está nos indicando com seu binóculo apontado para um lugar que é “naquele tempo”. Um paradoxal tempo de lá, que é o lugar- tempo aqui presente, representado num espaço efêmero por três palavras que também designam a efemeridade, pois remetem ao deslocamento eterno da vida, das coisas, do tempo: nunca estamos exatamente no presente; nunca estamos exatamente onde nos encontramos fisicamente. Há sempre uma fratura...
Enxergar o que ocorreu “naquele tempo” de maneira ampliada é uma prerrogativa da passagem do tempo! O trabalho afirma uma tautologia que fica mais clara quando olhamos a série impressa “Vozes Latinas”. Nela, Adolfo multiplica as expressões latinas em poemas visuais sobre papel. Cada uma delas é uma pérola tautológica, um jogo entre a palavra lida e o significado que se revela, desdobrando-se através da imagem da palavra. Mas para falar delas, outro tempo-espaço é preciso...
Fabiana Éboli Santos [outubro 2012]
Quando olhamos através de um binóculo, buscamos a aproximação de uma paisagem, situação ou objeto que se encontra a grande distância. Vemos, então, de forma ampliada, aquilo que antes não conseguíamos distinguir. A súbita revelação da imagem pode nos surpreender, quando nem desconfiamos do que está lá, longe... em sua existência minúscula.
Não há dúvida quanto ao aspecto lúdico, irônico até, que envolve o uso do binóculo. Voyeurismo sem maiores consequências ou espionagem intencional, o binóculo aqui é passaporte para uma viagem no tempo, qualquer tempo que se escolha, mas sempre outro...
Adolfo Montejo trabalha com uma série de expressões latinas realocando significados de um vernáculo não mais em uso, porém subjacente a todo idioma de origem latina e residual na linguagem contemporânea. Mesmo que não saibamos a tradução de uma palavra em latim, intuímos o que ela significa. Há uma memória ancestral, arquetípica, inscrita, talvez, em nosso DNA.
O jogo que Adolfo sugere é irônico, uma espécie de charada visual-linguística espacio-temporal: através do binóculo, em letras quase imperceptíveis na parede do fundo da Vitrine, o que lemos nos desconcerta, porque nos envia a um lugar temporal, num movimento de retorno a onde estamos... In illo tempore.
A expressão latina in é uma preposição que pode ser usada como verbo, designando movimento, deslocamento no espaço em direção a um ponto – lugar ou tempo. Funciona como “em”, “contra”, “para”, “sobre”, “entre”, “durante”, “depois”, “até”, “diante de”...
A palavra illo, adverbio, designa lugar, porém incorporando também o movimento de ir, encaminhar-se para um ponto além, que pode significar ponto de partida ou somente um ponto situado do lado de lá.
Tempore, diferentemente de tempus (tempo, momento, instante, hora), precedido de in designa especificamente “em tempo oportuno”, novamente nos remetendo à ideia de tempo-lugar - no caso da instalação na Vitrine, aqui agora.
O binóculo, ao revelar a expressão In illo tempore, funciona como dispositivo de deslocamento no tempo e evoca uma memória; como dispositivo de deslocamento espacial enfatiza a idéia de distância e nos remete a uma época vinculada àquela memória, portanto ausente, mas tornada presente e atual pelas palavras aproximadas.
Giorgio Agamben diz que contemporâneo é aquele que percebe, de seu tempo, não as luzes e sim as sombras. Deduz-se que, para obter uma percepção menos distorcida do presente em que estamos imersos, é necessário distanciamento. E que distanciamento seria esse? A Crítica? A História? O Tempo?
Talvez seja isso que o artista está nos indicando com seu binóculo apontado para um lugar que é “naquele tempo”. Um paradoxal tempo de lá, que é o lugar- tempo aqui presente, representado num espaço efêmero por três palavras que também designam a efemeridade, pois remetem ao deslocamento eterno da vida, das coisas, do tempo: nunca estamos exatamente no presente; nunca estamos exatamente onde nos encontramos fisicamente. Há sempre uma fratura...
Enxergar o que ocorreu “naquele tempo” de maneira ampliada é uma prerrogativa da passagem do tempo! O trabalho afirma uma tautologia que fica mais clara quando olhamos a série impressa “Vozes Latinas”. Nela, Adolfo multiplica as expressões latinas em poemas visuais sobre papel. Cada uma delas é uma pérola tautológica, um jogo entre a palavra lida e o significado que se revela, desdobrando-se através da imagem da palavra. Mas para falar delas, outro tempo-espaço é preciso...
Fabiana Éboli Santos [outubro 2012]