PONTOS DE CONTATO
|
Pontos de Contato
“O encontro de duas personalidades assemelha-se
ao contato de duas substâncias químicas: se alguma reação ocorre, ambos sofrem uma transformação”. Jung As relações humanas são complexas desde o seu cerne, isto é, exigem de nós atenção, cuidado e, seguramente, compreensão. Se desejamos construir entendimentos é preciso que estejamos habilitados a dialogar, sejamos aptos a alteridade, pois dependem eles do que cada um traz consigo de suas experiências, seu caráter moral e ético, sua capacidade cognitiva, sua inteligência emocional, seus afetos ou rejeições, extroversão ou introversão, valores políticos ou religiosos, quase que uma infinidade de sentimentos afora a combinação exponencial de todos eles para a consecução de um mínimo diálogo.
Por outro lado, para sairmos da inércia e construirmos essa sinergia necessitamos de uma força que nos mova, não apenas aquela força de contato gerada por dois corpos como diz a Segunda Lei de Newton, mas aquela que o pai da psicologia analítica nos indica em seu livro A Prática da Psicoterapia, uma força transformadora aflorada dentre o encontro de dois que se disponham a ouvir um ao outro sem críticas tendenciosas, sem malícias intelectivas, sem intenções enganosas, ao contrário, abertos à comunicação estimulante, às ideias em disputa zelosa, procurando realçar o que uma “reação química” produz: um novo composto. Em Pontos de Contato temos o convívio de quatro artistas pelas salas do Espaço Cultural que abrigam diferentes criações intercambiadas com que se pretende uma conversação onde se sobressaiam não as diferenças, mas os aprendizados a partir das diferenças. E aí verificamos as correlações das máscaras plurifacetadas de Julio Castro e as sobreposições de imagens de Marco Cavalcanti; a analogia sistemática do aglomerado de linhas no calendário de Nena Balthar ao acúmulo cotidiano de pelos em tubos de ensaio de Pedro Paulo Domingues, apenas para citar alguns dos lampejos com os quais podemos nos deparar na presente mostra. Isso equivale dizer que do corpo-a-corpo de suas lidas diárias, das imperativas restrições de um longo período de pandemia, há poéticas que ora se exibem aos visitantes emergidas de fazeres individuais, é certo, mas que menos afastam que aproximam esses artistas. Em A Forma Difícil Rodrigo Naves observa a necessidade de diálogo real para se atingir uma dinâmica efetiva sobre a produção de arte no Brasil, o que, a seu ver, só ocorre na década de 50 do século XX, e isso se dá pelo debate dos movimentos concreto e neoconcreto. De lá para cá dispomos de uma rica produção que agrega conceitos e extrapola limites trazendo reservas de conhecimento das mais variadas áreas do saber, o debate foi ampliado. Os artistas de Pontos de Contato são consequência daquelas argumentações e a elas dão sequência em suas proposições em que, por fluxo de ideias, vão desde hifas à Capela Cistina, do sutil contato entre plantas ao dedo de Deus estendido para Adão com seu indicador recurvado ainda por decidir sobre seu destino. Ao público é dada a mesma perspectiva ou encontra suas conexões ou as deixa em suspenso. Porém, aquele que se põe diante de um enigma, mais do que querer decifrá-lo, busca interagir com ele, fazer dele uma inspiração para sua própria existência. Esse é o poder que a Arte tem, ela nos guia em nossa incursão pela vida, bem como nos encoraja a transcender. Osvaldo Carvalho |