Victor Arruda
relax
março de 2013
relax
março de 2013
5 Comentários a Relax
Adolfo Montejo Navas
“O conteúdo e a imagem são o mais importante. Trata-se de espalhar o conteúdo, por um boato, uma ideia ou uma imagem. No final, tudo pertence a todos”. Maurizio Catellan
1. A presença da textualidade na dicção visual de Victor Arruda pode ser rastreada desde os anos 70, em sua pintura com textos-diálogos (mini narrativas) e nos anos 90 e 2000, com uma pintura “abstrata” com palavras (frases minimalistas). Há, portanto, uma vertente de atenção, nada submersa, que inclui a figurabilidade semântica das palavras como ferramenta imagética e elemento constitutivo de representação, o que já deu lugar a experiências pictóricas com proposições verbais conturbadas ou rotundas; aliás, sempre manuscritas, como evidenciam também alguns neons anteriores do artista (a vertente aforística, recentemente reconhecida em publicação, é uma prova a mais de como “des-sentenciar” o lugar comum é importante).
2. Com Relax (2013), trabalho idealizado ex-professo para o espaço condensado da Vitrine Efêmera, estamos, portanto, ante um jogo de linguagem: “este neon não é para você meter a mão no bolso”. O convite de leitura é tautológico e ao mesmo tempo humorístico: é para não nos sentirmos obrigados a responder ao reclamo especular, e nesse sentido funciona como um contra-anúncio, como avesso das recomendações do consumo e desvio irônico das normas publicitárias. A sua força negativa está na “criação de estranheza, em certo curto-circuito na comunicação/informação/percepção” (segundo confessa o artista em recente conversa telefônica, 8-3), ainda mais sendo contextualizado como um site-specific de bolso, com seu olhar de leitura orientado para a rua, para ser divisado em nossa passagem.
3. Implicitamente, também percebe-se que isto não é um anúncio (no sentido comercial), apesar de que a mensagem-suporte joga com as aparências de sê-lo. A equivalência ou parecido da frase joga com a semelhança e a des-semelhança (é seu lado intolerável, como diria Jacques Rancière), pelo fato de ser perturbador o equilíbrio semântico que Relax abriga como duplo, como sombra. O que não deixa de ter um eco magrittiano, referência sempre cara ao artista (não esqueçamos que o pintor belga soube ser surrealista e pré-conceitual, metalingüístico e bad painting, sem remorso algum, para espanto de muitos). Relax trata, pois, da refutação de um pathos econômico que sempre usa técnicas maximalistas e objetivas – e a maioria das vezes visuais– para acompanhar e intervir no itinerário de nossa acidentada subjetividade com um imaginário sempre em regime de exploração.
4. Dentro, e fora, da cosmocrise contemporânea, nunca é demais lembrar como Victor Arruda vem contribuindo há tempos com uma galeria de trabalhos nos quais o dinheiro está em grande focalização. São diversas obras em que a idolatria econômica, contemplada como miragem totalitária e teleológica, recebe interpretações críticas, reflexões cáusticas (fazem parte deste banco de imagens: Homenagem às vítimas do dinheiro, Conserta-se dinheiro, All they need is money, Cuidado Banqueiros, O dinheiro absorve qualquer metáfora, 2006, década 2000, 2009, 2010, 2011, respectivamente); propondo, em suma, outra leitura menos mimética e factual.
5. Como a grande parte de seu trabalho, pictórico ou não, Relax pode ser inscrito, dentro daquela dualidade imagética (imagem-ficção e imagem-fricção), concretamente nesta última, pois – como Goya ou Damien Hirst – a convocatória visual inclui certo atrito cognitivo com nossa consciência estética. De fato, a subversão da legibilidade imperante (linguística, social, moral) sempre foi o baixo continuo de sua obra, reconhecidamente crítica, heterodoxa. Relax oferece, em sua austeridade luminosa de imagem que não é mercadoria, uma contra especulação que atrita a conexão do verbal e do visual, seu regime ordinário mais instrumentalizador. A transmissão do idêntico como identidade fechada das coisas (o categórico imposto) não está em Relax nem em seus interesses dissociadores. O neon imantado como graffiti apresenta um hiato, uma quebra – uma terceira margem da imagem – e esse dissenso imagético dialoga com nossa emancipação em curso como espectadores em trânsito.
Foz do Iguaçu/Rio de Janeiro, março de 2013
Adolfo Montejo Navas
“O conteúdo e a imagem são o mais importante. Trata-se de espalhar o conteúdo, por um boato, uma ideia ou uma imagem. No final, tudo pertence a todos”. Maurizio Catellan
1. A presença da textualidade na dicção visual de Victor Arruda pode ser rastreada desde os anos 70, em sua pintura com textos-diálogos (mini narrativas) e nos anos 90 e 2000, com uma pintura “abstrata” com palavras (frases minimalistas). Há, portanto, uma vertente de atenção, nada submersa, que inclui a figurabilidade semântica das palavras como ferramenta imagética e elemento constitutivo de representação, o que já deu lugar a experiências pictóricas com proposições verbais conturbadas ou rotundas; aliás, sempre manuscritas, como evidenciam também alguns neons anteriores do artista (a vertente aforística, recentemente reconhecida em publicação, é uma prova a mais de como “des-sentenciar” o lugar comum é importante).
2. Com Relax (2013), trabalho idealizado ex-professo para o espaço condensado da Vitrine Efêmera, estamos, portanto, ante um jogo de linguagem: “este neon não é para você meter a mão no bolso”. O convite de leitura é tautológico e ao mesmo tempo humorístico: é para não nos sentirmos obrigados a responder ao reclamo especular, e nesse sentido funciona como um contra-anúncio, como avesso das recomendações do consumo e desvio irônico das normas publicitárias. A sua força negativa está na “criação de estranheza, em certo curto-circuito na comunicação/informação/percepção” (segundo confessa o artista em recente conversa telefônica, 8-3), ainda mais sendo contextualizado como um site-specific de bolso, com seu olhar de leitura orientado para a rua, para ser divisado em nossa passagem.
3. Implicitamente, também percebe-se que isto não é um anúncio (no sentido comercial), apesar de que a mensagem-suporte joga com as aparências de sê-lo. A equivalência ou parecido da frase joga com a semelhança e a des-semelhança (é seu lado intolerável, como diria Jacques Rancière), pelo fato de ser perturbador o equilíbrio semântico que Relax abriga como duplo, como sombra. O que não deixa de ter um eco magrittiano, referência sempre cara ao artista (não esqueçamos que o pintor belga soube ser surrealista e pré-conceitual, metalingüístico e bad painting, sem remorso algum, para espanto de muitos). Relax trata, pois, da refutação de um pathos econômico que sempre usa técnicas maximalistas e objetivas – e a maioria das vezes visuais– para acompanhar e intervir no itinerário de nossa acidentada subjetividade com um imaginário sempre em regime de exploração.
4. Dentro, e fora, da cosmocrise contemporânea, nunca é demais lembrar como Victor Arruda vem contribuindo há tempos com uma galeria de trabalhos nos quais o dinheiro está em grande focalização. São diversas obras em que a idolatria econômica, contemplada como miragem totalitária e teleológica, recebe interpretações críticas, reflexões cáusticas (fazem parte deste banco de imagens: Homenagem às vítimas do dinheiro, Conserta-se dinheiro, All they need is money, Cuidado Banqueiros, O dinheiro absorve qualquer metáfora, 2006, década 2000, 2009, 2010, 2011, respectivamente); propondo, em suma, outra leitura menos mimética e factual.
5. Como a grande parte de seu trabalho, pictórico ou não, Relax pode ser inscrito, dentro daquela dualidade imagética (imagem-ficção e imagem-fricção), concretamente nesta última, pois – como Goya ou Damien Hirst – a convocatória visual inclui certo atrito cognitivo com nossa consciência estética. De fato, a subversão da legibilidade imperante (linguística, social, moral) sempre foi o baixo continuo de sua obra, reconhecidamente crítica, heterodoxa. Relax oferece, em sua austeridade luminosa de imagem que não é mercadoria, uma contra especulação que atrita a conexão do verbal e do visual, seu regime ordinário mais instrumentalizador. A transmissão do idêntico como identidade fechada das coisas (o categórico imposto) não está em Relax nem em seus interesses dissociadores. O neon imantado como graffiti apresenta um hiato, uma quebra – uma terceira margem da imagem – e esse dissenso imagético dialoga com nossa emancipação em curso como espectadores em trânsito.
Foz do Iguaçu/Rio de Janeiro, março de 2013